Kléria Patricia Soares Barros
O tema da água permanece bastante em
voga na cidade desde finais dos anos 80, na
medida em que se discute e se concorda
cada vez mais com um projeto relativamente vago
de “devolução” do acesso à sua orla
fluvial. “Desobstruir”, então, passou a ser uma concepção
praticamente consensual, numa
articulação entre “requalificação” e “revitalização”
do
território e “resgate” do contato com a natureza. (Juliano Ponte)
Em torno de Belém
(PA), norte do Brasil, podemos falar na existência de uma política sobre a apropriação e as formas
de uso do território próximo à água. Atualmente, intervenções territoriais e
políticas públicas lidam, em frentes diversas, com esse contexto através de
projetos urbanísticos, ambientais, da modernização portuária e da promoção de
discursos da sustentabilidade e da melhoria do ambiente urbano em geral. Tais
ações parecem apontar para uma reconfiguração de espaços, em direção a uma
incorporação do patrimônio cultural à dimensão ambiental; a uma pretensa retomada
da natureza na cidade; à mudança do caráter da zona portuária; e à conversão da
ideia de Natureza” em paisagem de consumo visual, em projetos de autodeclaradas
“sustentabilidades” no território próximo à água.
Uma análise feita a partir de notas referentes ao Mangal
das Garças na mídia3, desde quando se começou a cogitar a ideia de implantação
desse complexo turístico, no ano de 2001 até o ano de 2007, pode ser
considerado um levantamento importante para a construção dessa pesquisa, pois
iremos compreender, a partir dos interesses de estruturação daquele espaço os
valores intrínsecos presentes na elaboração do referido projeto. É importante explicitar,
que a partir da pesquisa do material relacionado ao Mangal das Garças, tivemos
contato com várias informações a respeito daquele ambiente, possibilitando a
pesquisa elementos importantes para sua construção. Logo, faremos referencia a
essas notas veiculadas na mídia, para posteriormente compreendermos a lógica de
construção daquele espaço voltado para atender
os
interesses de lazer da classe dominante em detrimento da classe trabalhadora.
Mangal das Garças:
O Mangal
das Garças é um espaço que pretende reconstituir a fauna e a flora de parte dos
ecossistemas amazônicos, à beira do rio Guamá. Possui uma série de espaços e
viveiros onde borboletas, pássaros, orquídeas e demais espécimes da região são
expostos ao visitante (Pará, 2005a):
Considerando-se
as condições paisagísticas da área, a intenção foi a criação de um Parque
Naturalístico, cujo tema é a representação das diferentes macro regiões [sic]
florísticas do Estado do Pará, isto é, as Matas de Terra Firme, as Matas de
Várzea e os Campos. Entre lagos, vegetação típica, equipamentos de cultura e
lazer, juntamente com a inusitada paisagem do aningal¹ existente, o Mangal das
Garças representa uma síntese do ambiente amazônico, bem no coração da cidade.
Uma obra emblemática onde a natureza é preservada e o homem aprende a conviver,
sem destruir, com a sua circunstância ambiental. O projeto harmoniza os acessos
com as vias existentes e terrenos do entorno, aproveitando-se a presença da
água para a implementação de um grande lago como o seu ponto principal, além do
rio, circundado, equilibradamente, por caminhos e passeios pavimentados, que
interligam o estacionamento, áreas de estar e os equipamentos de lazer e
serviços. O destaque às peculiaridades da paisagem amazônia levará o visitante
à descoberta de perspectivas exóticas, que integram ambientes das matas de
várzea do estuário, de terra firme e campos com o aningal. (Pará, 2005a.)
O Mangal das Garças foi inaugurado em 12 de Janeiro de
2005, é uma área que compreende 34,7 mil metros quadrados contígua ao arsenal
da marinha. O espaço foi projetado pelo secretário da cultura Paulo Chaves e
sua equipe, é um complexo cultural e turístico, representando uma síntese do
ambiente amazônico dentro da metrópole, as margens do Rio Guamá. (Guia
turístico do Pará, 2005).
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¹. A aninga é uma
vegetação típica de áreas alagáveis da região, em geral lodosas. A espécie
vegetal chega a atingir metros de altura, às margens dos cursos d’água.
O espaço é considerado, segundo o secretário de cultura
que o projetou, um espaço de resgate do ambiente natural, pois segundo o mesmo,
houve uma preocupação em deixar presente no espaço uma representatividade da
mata de várzea e alguns exemplares da forma regional.
Na dimensão patrimonial da ideia de melhoria da
“qualidade de vida” na cidade há inclusive uma declarada intenção de remeter ao
passado da cidade de Belém, com a construção de um mirante sobre estrutura
metálica, onde está instalado o “Farol de Belém...que encontra-se inscrito nas
cartas náuticas brasileiras” (Pará, 2005a). Na cidade havia uma série de caixas
d’água metálicas, remanescentes das concessionárias privadas de abastecimento
de água, de capital inglês (Ximenes, 2003). O passadismo pós-moderno, da
reciclagem dos signos da cidade remodelados para o presente (Harvey, 2000),
está, portanto contemplado; a alegação da História confere, provavelmente, mais
“dignidade” ao projeto.
O processo de educação ambiental do cidadão, o reconhecimento
da própria natureza do entorno e a capacidade de consumir visualmente a imagem
amazônica estão vinculados, ao que parece, à experiência da visitação informada
ao parque. Obviamente, trata-se de uma intervenção urbanística e,
como
tal, a artificialidade não poderia deixar de ser praticamente total no espaço.
No entanto, longe de qualquer purismo ou forma simplória de consideração do par
cultura/natureza, cabe observar como a produção do lugar e a produção da
natureza ordenada, logram papel de destaque no urbanismo contemporâneo e na
requalificação dos espaços urbanos. Torna-se evidente que a questão
metodológica é antes outra: a da desnaturalização da paisagem, historicizada e
culturalizada em sua dimensão pretensamente “natural”.
Uma das contradições mais interessantes a respeito desse
coletivo, múltiplo e intrigante senso comum – o de “revitalizar” as margens
fluviais da cidade e restabelecer o contato com a natureza – é a série de
impactos que ele tem provocado. Em termos urbanísticos, é visível a tendência
do mercado imobiliário em captar o potencial de localização das margens
fluviais (Ximenes, 2004). Também é representativa a tendência histórica ao enobrecimento
(que a literatura também trata como gentrification) dos espaços do
centro histórico (Ximenes, 2004), cuja qualidade patrimonial o coloca,
portanto, como mais um espaço “da qualidade de vida”, nos termos da
sustentabilidade urbana. A óbvia instauração de um padrão progressivamente
desigual de localização e de apropriação
dos recursos nos remete a uma ideia de segregação, de estabelecimento de novas
fronteiras no espaço urbano, valorizado cultural e economicamente em certas
áreas. As ações e a justificativa do novo padrão de intervenção (desobstruir,
requalificar, retomar o contato com a natureza etc.) teriam seu argumento na
ideia de um ciclo: aumento de receita pública, aumento de investimentos
sociais, melhoria da “qualidade de vida”. Em síntese, a tendência e a semelhança
com outros casos nos remetem mais à ideia de “sustentabilidade do dinheiro do
que do meio ambiente” (Sachs, 1997, p.18). A ideia de “desenvolvimento”, nos
marcos da economia de mercado (Sachs, 1997), permanece dessa feita, acentuada a
partir do convencimento coletivo de que um novo padrão de “requalificação” e
“sustentabilidade” dos espaços deve ser instalado.
Figura (1): Viveiro de Flamingos
Foto: google imagens
Fora
as críticas relativas ao projeto, o visitante tem a chance de fazer o olhar
sobrevoar pontos especiais como o grande lago central, os caminhos sinuosos, os
canteiros coloridos, as áreas de estar e os equipamentos de lazer e serviços.
Os lagos artificiais do complexo receberam aves pernaltas, marrecos e quelônios
criteriosamente selecionados. Recantos com caramanchões em madeira criam oásis
de sombra perfeitos para o descanso. O local possui: O Museu Amazônico da
Navegação, Manjar das Garças, um dos melhores restaurantes da capital. Viveiro
das Aningas ou Viveiro dos Pássaros, onde o visitante tem contato direto com
uma impressionante quantidade de pássaros. O Farol de Belém, com 47 metros de
altura, a monumental torre-mirante do Mangal das Garças oferece dois níveis de
observação. O Borboletário, numa área de 1.400 m², o ambiente é o primeiro do
gênero da região Norte e já é apontado como o maior de todo o Brasil.
Orquidiário. O Criatório e Viveiro de Plantas. Armazém do Tempo, onde os
visitantes podem comprar plantas, artesanato, livros e CDs de artistas
paraenses e é possível saborear no local um requintado serviço de café. Além de
um belíssimo por do sol.
Figura (2): Borboletário
Foto: google imagens
Foto: google imagens
Considerações Finais:
Apesar
de todas as críticas a respeito de um projeto de tão grande porte como este. Conhecer
esse lugar trouxe uma experiência que jamais esquecerei, proporcionou ter uma
visão mais estendida sobre como desenvolver um projeto paisagístico de qualidade.
A proposta da viagem não poderia ter tido êxito maior, pois, a qualidade do
conhecimento obtido foi tão grande, que nem sei se outra viagem será capaz de
superar.
Uma
viagem como esta serve para mostrar, como nosso país é rico, e não damos o
devido valor a sua historia. Espero sinceramente que após essa primeira
experiência, possamos olhar para o lugar a qual pertencemos com outros olhos, e
percebermos, que podemos ter muito a aprender sem ter que ir muito longe.
Referências
Bibliográficas: http://www.mangalpa.com.br/
(PONTES, Juliano) – Reconfiguração
de Margens Fluviais e Belém – PA (tese)
(SILVA, Elba Maia e AGUIAR, Eliane do
S.)Mangal: construído pra quem?(tese)
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