O material publicado neste blog é resultado dos trabalhos desenvolvidos na disciplina História da Arquitetura e do Urbanismo no Brasil, do Curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Tocantins. Os temas dos artigos resultaram da Visita técnica realizada à cidade de Belém do Pará, nos dias 6 e 7 de dezembro de 2013, coordenada pela professora Patrícia Orfila, responsável pela disciplina.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

As influências da reforma de Paris nas intervenções urbanas em Belém



Haroldo Dias Pereira 
Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal do Tocantins


BELÉM E SUAS CARACTERÍSTICAS
            Belém, a capital do estado do Pará, foi o primeiro núcleo colonial português na Amazônia. A cidade fica localizada às margens da Baía do Guarujá e do Rio Guamá e tem, de acordo, com o Censo realizado nos anos 2000, aproximadamente 1.280.614 habitantes, distribuídos em seu vasto território. A cidade é um arquipélago e é composta por uma parcela continental e outra insular, para se ter uma noção a cidade possuiu ao todo aproximadamente 33 ilhas. (CASTILHO; VARGAS, 2009)
            A cidade de Belém foi fundada em 1616, e teve como o ponto de partida para a determinação de sua localização e expansão a orla dos rios pelos quais a cidade é banhada. A expansão da cidade ocorreu ao longo da orla do Rio Guamá, originando o Bairro da Cidade, que nos dias de hoje é conhecido como Cidade Velha. (CASTILHO; VARGAS, 2009)
            Hoje a Cidade Velha é uma das áreas onde se concentram as principais atividades, tanto comerciais, quanto culturais da capital paraense. É também onde ficam localizados alguns dos principais pontos turísticos, que atraem anualmente, uma grande quantidade de turistas para a cidade, como o Mercado Ver-o-Peso, a Estação das Docas, o Museu da Casa das Onze Janelas e outros inúmeros pontos referenciais da cidade. 

A BELLE ÉPOQUE E A BURGUESIA INDUSTRIAL
            A Belle Époque era um movimento de caráter cultural, social e mental. Podia ser compreendida como uma forma de manifestação da Idade de Ouro da burguesia industrial (COELHO, 20??). As transformações que ocorreram em algumas das cidades brasileiras, tanto Belém quanto o Rio de Janeiro e outras, são resultados de intervenções urbanas que podem ser considerados importantes legados deixados sob a influência das grandes e inúmeras reformas realizadas nas cidades europeias, no decorrer do século XIX, as quais tentavam encontrar soluções para os problemas que surgiram com a cidade industrial, ocasionados pelo advento da indústria na Revolução Industrial do século XIII.
            Belém também viveu sua própria Belle Époque, no final do século XIX. Seus bens de consumo e culturais eram, grande parte, de influência europeia, assim como grande parte das intervenções no seu âmbito urbano. Esses bens acabaram por se tornar parte da vida cotidiana dos habitantes belenenses (COELHO, 20??).
  
OS PROBLEMAS DA CIDADE INDUSTRIAL
            Durante o período da Revolução Industrial ocorreu um grande inchamento nas cidades Europeias. Esse inchamento foi ocasionado por uma enorme explosão demográfica em toda a Europa e pela drenagem das áreas rurais. Os moradores dessas áreas, em busca de melhores oportunidades, saem do campo e mudam-se para essas cidades, que já abarrotadas, não possuem infraestrutura suficiente e adequada para receber essa população.
A evolução tecnológica nos meios de produção e de transporte, a necessidade de adaptação dessas cidades à nova sociedade que a habita e as novas funções urbanas provocadas pela Revolução Industrial, ocasionam no surgimento de uma nova ordem, de um rompimento com os velhos quadros urbanos (CHOAY, 2010).
Algumas das características dessa nova ordem são as aberturas de grandes vias arteriais, a setorização urbana, a criação de estações e de áreas verdes e livres. A criação de novos órgãos também muda a cara dessa nova cidade.
A partir dessa nova ordem, começam a ser pensadas formas de melhorar a qualidade de vida dessa nova sociedade industrial. Surgem então, as primeiras leis sanitárias, higienistas, trabalhistas e modelos urbanísticos, que buscam melhorar os aspectos de habitação nessas cidades, que eram consideradas insalubres.

A REFORMA HAUSSMANIANA      
            No período de 1853 à 1870 (CASTLEX; DEPULE; PANERAI, 2013), a cidade de Paris sofre diversas reformas de cunho urbanístico  visando a amenização, ou até a solução, dos inúmeros problemas que foram desencadeados pela Revolução Industrial. A reforma de Paris, também chamada de reforma de Haussmann, foi uma das principais, ou quem sabe até a mais importante, reforma realizada na Europa durante o período do século XIX.
            Na reforma de Paris, liderada por Georges-Eugène Haussmann (1809 - 1891), foram executadas diversas obras, incluindo as de melhoria nas redes de esgoto, iluminação a gás, abastecimento de água, construção de aquedutos, implantação de serviços de transporte, abertura de parques e áreas verdes e a construção de edifícios públicos.
       As reformas tinham como bases, três princípios chaves: a circulação acessível e confortável na cidade, a eliminação da insalubridade e a revalorização e reenquadramento dos monumentos. Esses reenquadramento poderia ser obtido através de perspectivas nas grandes bulevares abertas na cidade (PORTO; et al, 2012).
           Foram abertas, na cidade, novas artérias nos antigos bairros. A malha original de Paris sofreu uma grande adequação à nova malha que era composta por ruas agora largas e retilíneas, que serviam de ligação entre os centros e as estações.
            A população de classe mais baixa foi expulsa do centro parisiense e realocada em áreas mais afastadas do centro, as periferias, gerando assim certa segregação entre as classes trabalhadoras e a burguesia.

ANTÔNIO LEMOS
            Em 1897, Antônio Lemos (1843 - 1913) atingiu o ápice de sua carreira, quando foi eleito como intendente da cidade de Belém (o cargo de intendente é correspondente ao cargo de um prefeito municipal) (MONTENEGRO, 2010). Lemos foi o responsável por grande parte das transformações urbanas realizadas em Belém no fim do século XIX e início do século XX. Considerado, até hoje, um dos maiores administradores públicos dos últimos tempos no Brasil, Lemos tinha um lema: Ordem e progresso.
            Antônio Lemos tinha como influência, as ideias das reformas que ocorreram no século XIX na Europa, principalmente a realizada por Haussmann na cidade de Paris. Dentre as suas obras, estavam a aberturas de grandes avenidas (as famosas bulevares), praças e arborização pela cidade.
             
AS INTERVENÇÕES E TRANSFORMAÇÕES URBANAS EM BELÉM
            Belém atingiu o auge da sua economia no período da borracha, durante a gestão do intendente Antônio Lemos, grande responsável por trás das intervenções na cidade durante a época.
            A maior parte dos investimentos realizados pela gestão de Lemos foram destinados à resolver as deficiências da cidade em relação ao saneamento, à iluminação pública, que passou a ser elétrica, a substituição do transporte via tração animal pelos bondes elétricos e no sistema viário urbano (PORTO; et al, 2012).
            Belém, assim como Paris e diversas outras cidades Europeias que passaram pelo processo de reforma, passou por um programa de "embelezamento estratégico" (PORTO; et al, 2012), que consistia em uma tentativa de tornar a cidade mais bonita e imponente, tanto para os moradores, quanto para os visitantes, consistindo principalmente na retirada de uma parcela mais pobre da população dos centros urbanos e da criação de medidas para evitar o "enfeiamento" da cidade.
            Lemos também investiu na construção de inúmeros palácios, teatros, grandes praças com lagos, inclusive no plantio de centenas de mudas de mangueiras, que eram oriundas da Índia para a criação de corredores sombreados nas grandes bulevares abertas, tudo bastante característico do estilo parisiense (PORTO; et al, 2012).
            Os traços do urbanismo das intervenções realizadas por Lemos são facilmente identificáveis em inúmeros lugares da cidade, como nas praças Batista Campos e da República, nas vias, no próprio centro urbano da cidade, que nos dias atuais, compreende os bairros do Reduto, Comércio e Campina. O alargamento da cidade chega ate o bairro de São Brás (MONTENEGRO, 2010).      

O BAIRRO DO "MARCO"
            Criado ainda na gestão municipal de Jerônimo Pimentel, o bairro do "Marco" passou por um processo de diversas melhorias durante o período em que Antônio Lemos permaneceu no cargo da gestão municipal de Belém. Foram abertas diversas vias, que eram orientadas no sentido nordeste-sudeste. As principais vias do bairro foram abertas com aproximadamente 44 m de largura e as transversais com 22 m. Foi implantada também uma malha ortogonal regular com quadras de 125 m x 250 m (PORTO; et al, 2012).
            Com o crescimento e o desenvolvimento cada vez maior, tanto do bairro do "Marco" quanto da tecnologia, o tráfego passou a ficar cada vez mais intenso e fizeram-se necessárias a abertura de mais vias, para que o tráfego pudesse comportar essa quantidade maior de veículos (PORTO; et al, 2012).

A INTERFERÊNCIA DO CÓDIGO DE POSTURA NA CONSTRUÇÃO DE BELÉM
            O código de postura também foi outra grande influência que a reforma de Haussmann exerceu nos planos de reformas e transformações de Belém. Tal código impunha algumas normas para a construção de novos prédios e edifícios. O código também legislava na propriedade privada, além de muitas vezes ser considerado autoritário e excludente (PORTO; et al, 2012).
            Dentre as leis que estavam contidas nesse novo código de postura, existiam algumas que proibiam a construção de barracos e casebres nos novos bulevares abertas por Lemos. Os barracos já existentes foram destruídos e os seus moradores deslocados para outras regiões da cidade (PORTO; et al, 2012). Devido à implantação desse código, boa parte da população dessa população (a maioria de baixa renda) que vivia no centro da cidade foi expulsa dessas áreas e acabaram sendo obrigados a se mudar para as áreas mais periféricas da cidade, provocando expansões de forma desordenada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASTLEX, Jean; DEPULE, Jean-Charles; PANERAI, Philipe. Formas Urbanas: A dissolução da quadra. Porto Alegre: Bookman, 2013.

CASTILHO, Ana Luisa Howard; VARGAS, Heliana Comin. Intervenções em Centros Urbanos: Objetivos, estratégias e resultados. 2 ed. rev e atual. Baruer: Manole, 2009.

CHOAY, Françoise. O Urbanismo: Utopias e realidades, uma antologia. 6 ed. São Paulo: Perspectiva, 2010.

PORTO, Aline L. G.; SECCO, Chiara B.; DELHADO, Gisele M.; VERBICARO, Camila C.; DEMARZO, Mauro A. A Influência "Haussmanniana" nas Intervenções Urbanísticas em Cidades Brasileiras. 2012.

COELHO, Geraldo Mártires. Na Belém da belle époque da borracha (1890-1910): dirigindo os olhares. Disponível em: < http://www.casaruibarbosa.gov.br/dados/DOC/revistas/Escritos_5/FCRB_Escritos_5_8_Geraldo_Martires_Coelho.pdf> Acesso em: 28 jan 2014.

MONTENEGRO, Will. Antônio Lemos  deu um passo ao futuro. 2010. Disponível em: < http://www.ufpa.br/historia/index.php?option=com_content&view=article&id=30:antonio-lemos-deu-um-passo-ao-futuro-> Acesso em: 28 jan 2014.

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